quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Rousseau (2)

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“Porque apenas alguém morrerá por um justo; pois poderá ser que pelo bom alguém ouse morrer. Mas Deus prova o seu amor para conosco, em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores.” - Paulo aos Romanos capítulo 5 versículos 7 e 8.

Jesus disse que a maior prova de amor está em alguém dar a própria vida pelos seus amigos. Quando Cristo morreu por nós ainda éramos seus inimigos.

Me lembro certa vez ao papear com um grande amigo de infância, o Fred, que falávamos das maldades de coração humano, e ele logo revidou que também há bons tesouros ali escondidos. Não tive como contra-argumentar…

Eis o dilema: afinal é o homem bom ou mau?

Eis o dilema: afinal é o homem bom ou mau? Existe o homem bom (ou justo) que por ele alguém ouse morrer? Cristo chamou seus discípulos de amigos, mas Paulo destaca que Ele morreu quando ainda éramos seus inimigos. Como sair dessa contradição humana?

Não há saída, somos mesmo contraditórios e permaneceremos assim: “miserável homem que sou quem me livrará do corpo dessa morte!” - Exclama o apóstolo dos gentios.

Rousseau ao ser confrontado por Francis Schaeffer é visto como um falso profeta do modernismo, que levou o homem a se afastar de Deus e levou a sociedade européia (e mundo) ao secularismo. Até que ponto as coisas são de fato assim mesmo?

Entendo da seguinte maneira:

1) Rousseau não falhou ao considerar o homem selvagem como puro e bom. Na verdade o homem civilizado também pode ser puro e bom.

2) A falha de Rousseau está em determinar que a civilização seja a causa dos males e da corrupção moral do indivíduo (embora essa obviamente exerça o seu papel para isso). Obviamente o homem seja ele selvagem ou civilizado é mau e se inclina para a maldade independente do seu ambiente.

Como crentes temos como verdade revelada que o homem foi criado bom (e esse é seu verdadeiro estado primitivo). E essa é a marca que permanece nele apesar da queda: Em sua origem mais remota o homem é bom, foi criado à semelhança de um Deus bondoso. A queda não lhe remove essa marca como não lhe remove necessariamente outras características, mas a deteriora drasticamente em diferentes níveis, dependendo de indivíduo para individuo e dependendo de diferentes situações e estados de espírito em cada indivíduo.

Assim o homem caído é mau (ainda os cristãos são maus) e permanecerá mau  até que haja uma total redenção, daí a necessidade de perdoar e de se pedir diariamente perdão pelos pecados, como o Cristo nos ensina na oração do Pai Nosso.

O que Rousseau e as histórias de Tarzan e Mogli têm de real é que o “progresso” das civilizações trouxe consigo males que o indivíduo primitivo (ou os animais) não possui em seu estado natural. Assim como Adão, os índios e também as crianças recém nascidas estão nus.

Nesse sentido a liberdade proposta por Rousseau tem sua razão de ser: Ela me remete para a solidão, para a isolação.

Como FS a definiu: é a liberdade absoluta.

“A liberdade que advogam é autônoma em que nada há a restringi-la. É a liberdade sem limitações. É a liberdade que não mais se ajusta no mundo racional. Apenas espera e tenta fazer pela força da vontade, com que o indivíduo finito seja livre – e tudo o que resta é expressão própria, expressão pessoal.”

À parte dos exageros, essa liberdade é muito importante hoje. Todavia tem o seu fim, quando esse indivíduo necessariamente encontra a comunidade da qual faz parte, querendo ou não. Somente nesse alternar de solidão e vida em comunidade é que nós conseguimos sermos nós mesmos, deixar que os outros sejam eles mesmos e melhor nos interagirmos.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Rousseau (1)

200px-Jean-Jacques_Rousseau_(painted_portrait)

Ao ler a introdução da biografia de Rousseau na Wikipedia fica claro a birra que FS deveria ter com ele, afinal como poderia aquele suíço, nascido na Genebra de Calvino, inspirar movimentos como a Revolução Francesa, o Marxismo e o Anarquismo? FS protesta:

“Mudança titânica é esta, que expressa uma situação secularizada. A natureza devorou totalmente a graça e o que lhe foi deixado em seu lugar no “andar de cima” foi o termo `liberdade´”.

A Wikipédia chama a atenção para que

“No fundo, Jean-Jacques Rousseau revela-se um cristão rebelado, desconfiado das interpretações eclesiásticas sobre os Evangelhos. Sempre proferia uma frase: "Quantos homens entre mim e Deus!", o que atraía a ira tanto de católicos como de protestantes.”

Continuando com FS ele afirmou que

“A luta pela preservação da liberdade é sustentada por Rousseau em alto grau. Rousseau e quantos o seguem, mercê de sua literatura e arte, expressam uma decidida rejeição da civilização como o elemento que restringe a liberdade humana. Sentem a pressão no “andar inferior” do homem reduzido a simples máquina. A ciência naturalista se torna um peso muito grande – um inimigo esmagador começa-se a perder a liberdade.”

Para os calvinistas parece não existir maior ameaça à soberania divina do que a autonomia e a liberdade humanas. Mas não seriam estas justamente uma das maiores expressões da graça e soberania divinas?

O problema de Rousseau não seria tanto a opressão da natureza mecânica e determinista mas de um "deus" determinista como Chaui muito bem observou:

“se a ética exige um sujeito autônomo, a idéia de dever não introduziria a heteronomia, isto é, o domínio de nossa vontade e de nossa consciência por um poder estranho a nós? Um dos filósofos que procuraram resolver essa dificuldade foi Rousseau, no século XVIII. Para ele, a consciência moral e o sentimento do dever são inatos, são “a voz da Natureza” e o “dedo de Deus” em nossos corações.

Nascemos puros e bons, dotados de generosidade e de benevolência para com os outros. Se o dever parece ser uma imposição e uma obrigação externa, imposta por Deus aos humanos, é porque nossa bondade natural foi pervertida pela sociedade, quando esta criou a propriedade privada e os interesses privados, tornando-nos egoístas, mentirosos e destrutivos. O dever simplesmente nos força a recordar nossa natureza originária e, portanto, só em aparência é imposição exterior. Obedecendo ao dever (à lei divina inscrita em nosso coração), estamos obedecendo a nós mesmos, aos nossos sentimentos e às nossas emoções e não à nossa razão, pois esta é responsável pela sociedade egoísta e perversa."

Antes de nos voltarmos para Kant farei no próximo Post uma breve análise desta visão de Rousseau que é obviamente falha.

domingo, 7 de dezembro de 2008

O CRISTIANISMO: INTERIORIDADE E DEVER

Para que possamos melhor entender o contexto da época de Rousseau busquei esta análise feita por Marilena Chaui.

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Diferentemente de outras religiões da Antiguidade, que eram nacionais e políticas, o cristianismo nasce como religião de indivíduos que não se definem por seu pertencimento a uma nação ou a um Estado, mas por sua fé num mesmo e único Deus. Em outras palavras, enquanto nas demais religiões antigas a divindade se relacionava com a comunidade social e politicamente organizada, o Deus cristão relaciona-se diretamente com os indivíduos que nele crêem. Isso significa, antes de qualquer coisa, que a vida ética do cristão não será definida por sua relação com a sociedade, mas por sua relação espiritual e interior com Deus. Dessa maneira, o cristianismo introduz duas diferenças primordiais na antiga concepção ética:

  • em primeiro lugar, a idéia de que a virtude se define por nossa relação com Deus e não com a cidade (a polis) nem com os outros. Nossa relação com os outros depende da qualidade de nossa relação com Deus, único mediador entre cada indivíduo e os demais. Por esse motivo, as duas virtudes cristãs primeiras e condições de todas as outras são a fé (qualidade da relação de nossa alma com Deus) e a caridade (o amor aos outros e a responsabilidade pela salvação dos outros, conforme exige a fé). As duas virtudes são privadas, isto é, são relações do indivíduo com Deus e com os outros, a partir da intimidade e da interioridade de cada um;
  • em segundo lugar, a afirmação de que somos dotados de vontade livre – ou livre-arbítrio – e que o primeiro impulso de nossa liberdade dirige-se para o mal e para o pecado, isto é, para a transgressão das leis divinas. Somos seres fracos, pecadores, divididos entre o bem (obediência a Deus) e o mal (submissão à tentação demoníaca). Em outras palavras, enquanto para os filósofos antigos a vontade era uma faculdade racional capaz de dominar e controlar a desmesura passional de nossos apetites e desejos, havendo, portanto, uma força interior (a vontade consciente) que nos tornava morais, para o cristianismo, a própria vontade está pervertida pelo pecado e precisamos do auxílio divino para nos tornarmos morais.

(...)

Tal concepção leva a introduzir uma nova idéia na moral: a idéia do dever. Por meio da revelação aos profetas (Antigo Testamento) e de Jesus Cristo (Novo Testamento), Deus tornou sua vontade e sua lei manifestas aos seres humanos, definindo eternamente o bem e o mal, a virtude e o vício, a felicidade e a infelicidade, a salvação e o castigo. Aos humanos, cabe reconhecer a vontade e a lei de Deus, cumprindo-as obrigatoriamente, isto é, por atos de dever. Estes tornam morais um sentimento, uma intenção, uma conduta ou uma ação. (...) O cristianismo, porém, é uma religião da interioridade, afirmando que a vontade e a lei divinas não estão escritas nas pedras nem nos pergaminhos, mas inscritas no coração dos seres humanos. A primeira relação ética, portanto, se estabelece entre o coração do indivíduo e Deus, entre a alma invisível e a divindade. Como conseqüência, passou-se a considerar como submetido ao julgamento ético tudo quanto, invisível aos olhos humanos, é visível ao espírito de Deus, portanto, tudo quanto acontece em nosso interior. O dever não se refere apenas às ações visíveis, mas também às intenções invisíveis, que passam a ser julgadas eticamente. Eis por que um cristão, quando se confessa, obriga-se a confessar pecados cometidos por atos, palavras e intenções. Sua alma, invisível, tem o testemunho do olhar de Deus, que a julga.

NATUREZA HUMANA E DEVER

O cristianismo introduz a idéia do dever para resolver um problema ético, qual seja, oferecer um caminho seguro para nossa vontade, que, sendo livre, mas fraca, sente-se dividida entre o bem e o mal. No entanto, essa idéia cria um problema novo. Se o sujeito moral é aquele que encontra em sua consciência (vontade, razão, coração) as normas da conduta virtuosa, submetendo-se apenas ao bem, jamais submetendo-se a poderes externos à consciência, como falar em comportamento ético por dever? Este não seria o poder externo de uma vontade externa (Deus), que nos domina e nos impõe suas leis, forçando-nos a agir em conformidade com regras vindas de fora de nossa consciência? Em outras palavras, se a ética exige um sujeito autônomo, a idéia de dever não introduziria a heteronomia, isto é, o domínio de nossa vontade e de nossa consciência por um poder estranho a nós?

Extraído de Convite à Filosofia - O mundo da prática - Marilena Chuaí.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Graça ou Liberdade

FC.0 Antes de fazermos uma boa análise da crítica de FS sobre Kant e Rousseau gostaria de lembrar que o quarto de milênio que nos separam desses pensadores é o mesmo que os separavam da reforma. Ou seja, o pulo é enorme. Ainda que FS faça uma boa ressalva quanto a isso, o pulo é indesculpável em uma análise mais séria.

A esta altura do livro percebo que FS coloca seus próprios conflitos ao longo de sua leitura da história das artes e da filosofia. Assim, não é que a Graça some do andar de cima com Kant ou Rousseau, mas provavelmente para FS, dentro do contextos dos anos 70, essa seria a conseqüência lógica de uma ênfase na liberdade. Basta que lembremos de Dostoievisk, para termos uma idéia da mentalidade da época, “se não existe Deus, tudo é permitido”.

Do meu ponto de vista a Graça e a Liberdade andam bem juntas e uma não anula a outra. Assim, penso, porque existe Deus, tudo é permitido.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Deus, ciência e razão

por Lou Melo

O autor português José Rodrigues dos Santos escreveu quinhentas e setenta e quatro páginas em seu excelente livro ” A Fórmula de Deus”, que me foi presenteado pela Vilma do blog Coisas de Mim, uma das boas amizades colhidas na blogosfera, para juntar os cacos quebrados do lado da ciência e do outro, a religião e, através de uma bem concatenada aventura, com nuances de um romance muito pertinente, demonstrar alguns pontos importantes de conexão entre, Deus, ciência e razão.

Foi o falecido teólogo, autor e pastor exótico, o norte-americano Francis Schaeffer, cult dos anos setenta e oitenta com seu trabalho de discipulado de jovens estrategicamente situado nos Alps – Suiça, lugar de fácil acesso a qualquer um de nós, jovens na época, quem defendeu e escreveu A Morte da Razão, onde, em exaustivas noventa e quatro páginas, ele buscou levar todos para o lado do espírito ou espiritual, insinuando a impossibilidade das forças do universo caminharem juntas. Na última página do meu exemplar desse livro você lerá, escrito a lápis, com a minha letra, “O autor não cumpriu sua proposição”. O filho dele, herdou esse legado e está condenado a gastar sua vida justificando seu pai imprudente. Mas ele não é o primeiro, Jesus Cristo fez a mesma coisa, muito tempo antes.

Sei que os privilegiados discípulos do Francis viveram uma experiência espiritual incomum lá no L’Abri. Pena que papai não estava em condições de pagar uma temporadazinha minha naquele paraiso, caso contrário, eu teria estado junto com ele, também, provavelmente. Isso poderia ter evitado esse post. Nem por isso, conseguiram anular a razão.

Deus, em sua imprudente falta de espiritualidade, enviou sinais de conectividade com seu Filho, inequívocos, durante a cena da crucificação. Quem esteve lá, jura ter visto a maior incidência de raios e trovões que se tem notícia. Segundo alguns, foi um dia horroroso, algo para se esquecer. Isso me faz lembrar o Tsunami na Ásia, alguns anos passados, onde estava a Marie, uma ex-aluna do Ginásio Vocacional que encontrei trabalhando com o Daniel Fresnot na Casa Taiguara. Naquele dia, Deus, ciência e razão deram-se as mãos e deixaram milhares de pessoas perceberem o quanto esses fenômenos andam irmanados. Fosse Deus, um lado oposto à razão, ele repreenderia ventos e mares, salvando todas aquelas vidas perdidas naquele horror.

Schaeffer, mesmo tendo sido um velhinho danado de simpático, estava errado. Não me admiro ao ver seu filho Franky e o bom pessoal da editora W4 lançando o livro “Viciados em Mediocridade” que eu li em inglês, coincidentemente, quando estava na Europa, em 1994. Não sou psicólogo, mas desconfio da herança genética do Franky. Toda essa história tem seus nuances filosóficos e um medo que rondou católicos e protestantes com o movimento dos existencialistas, particularmente os franceses. Sartre e Camus bagunçaram o coreto imperialista do norte ao estremecer um dos principais pilares desse demônio: a igreja e seu dogma. O fato é que a peste chegou até nós e fomos todos contaminados. Pior é viver nessa inglória luta tentando separar o joio do trigo. Afinal, há um fundo de verdade em tudo isso. Caso contrário, o novo Big Bang resolverá nosso probleminha.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Oito anos mais tarde

books Interessante que ´A Morte da Razão` foi publicado em 1968 e oito anos mais tarde em 1976 foi publicado ´Então como viveremos`, neste FS não é bairrista como foi naquele e detalha melhor seu ponto de vista sobre a influência do cristianimo na ciência moderna sem desmerecer outras correntes religiosas ou épocas.

Schaeffer argumenta principalmente que o cristianismo ao apontar um Deus criador que é o princípio e a causa de tudo possibilita uma ciência que vai a fundo ao pesquisar a natureza pois estaria baseado na idéia que existe uma "mente" criadora que organizou tudo sob uma lógica, de causa e efeito que poderia ser conhecida e aprendida pela humanidade.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

A ciência moderna

O que é a ciência moderna?

Ele só teve início após a reforma?

Em que a ciência moderna se difere da ciência?

Mais uma vez os argumentos de Schaeffer me parecem bem tendenciosos...

O cristianismo outorga  certeza da realidade objetiva e de causa e efeito, certeza suficientemente sólida para que sobre ela se assente o fundamento do saber.”

O meu ponto é: FS está correto em suas afirmações em si. A ciência depende da fé! E vice versa. Todavia em outras culturas religiosas aparecem elementos verdadeiros de fé que proporcionaram condições para o desenvolvimento das ciências.

Sem dúvida que outras culturas religiosas frearam o desenvolvimento das ciências, mas isso o cristianismo também fez!

Enfim temos que ser menos parcial e sabermos valorizar outras culturas sem o bairrismo evangelicalês.

Foto: J. Robert Oppenheimer, segundo FS ele afirmou que o Cristianismo era necessário para dar origem à ciência moderna[1].



[1] “On Science and Culture” (Sobre Ciência e Cultura), em ENCOUNTER (Encontro), Outubro de 1962.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Nada há autônomo

image" Nada há autônomo – nada à parte do soberano senhorio de Jesus Cristo e da autoridade das Escrituras. Deus fez o homem todo e está interessado no homem todo, e o resultado é uma unidade. Desta forma, ao mesmo tempo em que se processava o nascimento do homem moderno na Renascença, a Reforma dava a única resposta adequada ao dilema humano. Em contraste, o dualismo no homem renascentista trouxe à tona as modernas formas de Humanismo, com as misérias e sofrimentos do homem moderno." - Francis Schaeffer

Existem não poucos problemas nessa afirmação de FS, principalmente se levada aos extremos:

  1. Deus deu ao homem autonomia moral, após a queda, e após a redenção. Ainda somos livres para escolher entre o bem e o mal. O perigo de se pensar que somos máquinas se encontra tanto no behaviorismo como no calvinismo, se encarados de forma extrema.
  2. A tônica dada por FS ao ensino do homem integral é corretíssima, mas pensar que isso era uma patente dos reformadores pode ser muito perigoso.
  3. Também é perigoso pensar que a Reforma conseguiu superar o problema do dualismo, que aparece de forma explícita na Bíblia.

Assim continuo a me perguntar o que isso tudo teria a ver com as misérias do homem moderno. Ainda que eu seja um protestante, não consigo encarar as coisas como Schaeffer, o qual me parece muito tendencioso, até mesmo para sua época.

domingo, 9 de novembro de 2008

Quarenta livros que fizeram a cabeça dos evangélicos brasileiros nos últimos quarenta anos

Gostariade pimeiramente destacar o comentário feito por aquele autor sobre "A Morte da Razão" que aparece em sétimo lugar em ordem de importância:

7. “A Morte da Razão” -- Francis Schaeffer [ABU]
A intelectualidade evangélica adotou este livro como alicerce nos anos 70, para enfrentar o existencialismo, o movimento “hippie”, o marxismo e a contracultura em geral. O livro convencia que o cristianismo não era incompatível com o estudo e a reflexão. É um pena que Schaeffer estivesse tão equivocado em suas idéias centrais.

Baseado nesta listagem e na sugestão do autor, "divirta-se concordando ou discordando, corrigindo meus equívocos e fazendo sua própria lista", quero insentivá-lo a participar das enquetes ao lado e se possível deixar seus comentários, qual livro você acrescentaria, qual tiraria ou se você mudaria a ordem de algum.

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Vai aí então a listagem completa dos quarentas livros:

Extraído de Ultimato Edição 315 

image1. “Mananciais no Deserto” -- Lettie Cowman [Betânia]
Não há outro livro mais amado pelos evangélicos brasileiros. Este campeão de vendagem é um livro de leituras devocionais diárias que conquistou nosso país. O livro é, de fato, bom, mas desconfio que a tradução deu uma mãozinha.

image2. “Uma Igreja com Propósitos” -- Rick Warren [Vida]
O maior “best-seller” evangélico de todos os tempos é uma catástrofe literária. É ainda difícil calcular o dano que esta obra equivocada causou e ainda irá causar, com sua filosofia de ministério inteiramente vendida ao “Zeitgeist”, propondo a homogeneização das igrejas e um pragmatismo de dar medo.
image3. “A Quarta Dimensão” -- David Paul Yonggi Cho [Vida]
Este livro fez mais pelo movimento pentecostal no Brasil do que qualquer televangelista. O testemunho bem escrito do pastor coreano que vive cercado de milagres causou “frisson” até mesmo nos grupos mais conservadores. Seu modo de ver a vida com Deus e o ministério marcaram as últimas décadas.
image4. “A Agonia do Grande Planeta Terra” -- Hall Lindsay [Mundo Cristão]
Calcado no pré-milenismo dispensacionalista de Scofield, este “best-seller” apocalíptico empolgou os profetas do fim do mundo no Brasil, com sua interpretação literalista imprudente e seu patriotismo norte-americano acrítico. Lindsay foi o arauto de três décadas das mais absurdas especulações escatológicas em nossas igrejas.
image5. “O Ato Conjugal” -- Tim e Beverly La Haye [Betânia]
Sexo é um assunto importante, e o povo ansiava por uma orientação em face da revolução sexual dos anos 60. Daí o sucesso de um livro bem escrito como este, didático e conservador, ao gosto da moral evangélica, mas sem ser inteiramente obtuso. Mesmo assim, muitos o chamaram de pornográfico. Nada mais injusto.
image6. “Este Mundo Tenebroso” -- Frank Peretti [Vida]
A ficção convence mais rápido. Revoluções acontecem inspiradas por romances, e não por tratados filosóficos. Peretti, com seu horror cristão, nos ensinou o significado da batalha espiritual nos anos 80, reencantou o submundo evangélico, inspirou pregadores e, o que não é nada ruim, motivou muitos adolescentes a ler obras de ficção bem melhores.
image7. “A Morte da Razão” -- Francis Schaeffer [ABU]
A intelectualidade evangélica adotou este livro como alicerce nos anos 70, para enfrentar o existencialismo, o movimento “hippie”, o marxismo e a contracultura em geral. O livro convencia que o cristianismo não era incompatível com o estudo e a reflexão. É um pena que Schaeffer estivesse tão equivocado em suas idéias centrais.
image8. “Celebração da Disciplina” -- Richard J. Foster [Vida]
Este clássico da espiritualidade cristã, escrito por um quacre, fez um tremendo sucesso no Brasil a partir dos anos 80. É excelente, mas será que todos que o compraram de fato o leram? Gostaria de perceber uma maior influência das idéias de Foster em nosso povo, mais oração, silêncio, calma, estudo, empenho, enfim, disciplina espiritual.
image9. “De Dentro para Fora” -- Larry Crabb [Betânia]
Os livros devocionais evangélicos de viés psicológico ou de auto-ajuda são os títulos que mais vendem. Dentre eles, alguns se destacam não só por serem campeões de vendagem, mas porque são os melhores do gênero. Crabb é o melhor autor do gênero e este é seu melhor livro, que impactou o nosso povo nos anos 90.
image10. “Louvor que Liberta” -- Merlin R. Carothers [Betânia]
Este pequeno e poderoso manifesto em forma de testemunho revolucionou, nos anos 70, o louvor e a adoração no Brasil. O bom capelão ensinou a todos nós a espiritualidade da adoração, o poder do louvor, impulsionando as guerras litúrgicas que marcariam a vida de nossas comunidades a partir de então.
image11. “Vivendo sem Máscaras” -- Charles Swindoll [Betânia]
Outro “best-seller” devocional dos anos 90, de viés psicológico e de auto-ajuda, com o vigor característico das obras de Swindoll, escritas a partir de suas pregações. Muitos se sentiram não apenas edificados, mas tocados e transformados.
image12. “A Cruz e o Punhal” -- David Wilkerson [Betânia]
Outro opúsculo dos anos 70 que, na forma de um testemunho pessoal, inspirou os jovens evangélicos a uma fé mais comprometida. Curiosamente, não levou as igrejas a um investimento em missões urbanas, idéia que permeia todo o livro. Talvez o Brasil evangélico dos anos 70 não estivesse pronto para missões urbanas.
image13. “Crer é Também Pensar” -- John Stott [ABU]
Stott é um ícone no Brasil, um nome respeitado pela sua erudição e sua notável produção literária, apesar de estar invariavelmente sob suspeita de heresia pelos mais neuróticos. O fato é que a qualidade de seus livros varia. Seu excelente “Ouça o Espírito, Ouça o Mundo” merece mais atenção. Já o opúsculo selecionado, tão conhecido desde os anos 70, não tem muito a dizer além do título.
image14. “O Senhor do Impossível” -- Lloyd John Ogilvie [Vida]
Outro devocional que emplacou no Brasil nos anos 80, não sem méritos. É o maior sucesso do autor, ainda que inferior a “Quando Deus Pensou em Você”, que o antecedeu. O livro estimula a fé e nos faz mais esperançosos, apesar da teologia rasa.
image15. “A Família do Cristão” -- Larry Christenson [Betânia]
Antes de Dobson e tantos outros, Christenson já era “best-seller” nos anos 70. Pioneiro entre os que se pretendem auxiliares da vida familiar cristã, ele foi estudado nos lares por grupos e células, em escolas dominicais etc. Sua eficácia é comprovada.
image16. “O Jesus que Eu Nunca Conheci” -- Philip Yancey [Vida]
Os anos 90 assistiram ao aparecimento de um dos mais argutos e estimulantes autores evangélicos de todos os tempos: o audaz Yancey, que começou a apontar para o paradigma emergente em livros como “Alma Sobrevivente”, “Descobrindo Deus nos Lugares mais Inesperados”, “Maravilhosa Graça”, “Rumores de Outro Mundo”, “Decepcionado com Deus” e tantos outros livros excelentes. E o mais conhecido e lido parece ser mesmo “O Jesus que Eu Nunca Conheci”.
image17. “O Discípulo” -- Juan Carlos Ortiz [Betânia]
Poucos livros foram tão impactantes nos anos 70 quanto esta obra que, excepcionalmente, não vinha do mundo anglo-saxão, mas da Argentina. Por isso mesmo, Ortiz tinha uma outra linguagem, um discurso que convencia os jovens brasileiros da seriedade e do valor de se tornar mais do que um mero freqüentador de igrejas, um genuíno discípulo de Cristo.
image18. “Bom Dia, Espírito Santo” -- Benny Hinn [Bompastor]
O neopentecostalismo brasileiro é, em grande parte, de inspiração norte-americana. Talvez o nome mais importante nesse processo seja o do “showman” evangélico Benny Hinn, que desde os anos 90 assombra os norte-americanos pela televisão com seus feitos espetaculares. Mesmo quem não o leu conhece sua influência no Brasil.
image19. “O Refúgio Secreto” -- Corrie Ten Boom [Betânia]
O testemunho desta nobre senhora holandesa encantou também o Brasil, onde seu livro foi um grande sucesso nos anos 70. Suas aventuras durante a Segunda Guerra Mundial, sob o pano de fundo de sua educação em um lar cristão, são comoventes e inspiradoras.
image20. “A Autoridade do Crente” -- Kenneth Hagin [Infinita]
Hagin foi um divisor de águas no mundo evangélico, pois desde sua influência os crentes “tomam posse”, “determinam”, “amarram” e “exigem”. Uma nova forma de falar se fez presente, o que gerou muitas novas piadas também.
image21. “Entendes o que Lês?” -- Fee e Stuart [Vida Nova]
Que bom que um livro sério como este foi tão lido e estudado no Brasil. Trata-se de um compêndio de hermenêutica bíblica sem complicações, em linguagem acessível, adotado por quase todos os seminários e estudado até mesmo nas EBD’s e pequenos grupos. Este livro fez muito pela educação bíblica dos evangélicos brasileiros.
image22. “Culpa e Graça” -- Paul Tournier [ABU]
Não há, com raras exceções, psicólogo cristão que não considere este livro um fundamento e um marco do pensamento cristão. Mas ele não se limita a isso, tendo tido considerável influência na teologia evangélica brasileira nos anos 90, preparando nosso povo para o paradigma emergente do século 21.
image23. “Novos Líderes para Uma Nova Realidade” -- Caio Fábio D’Araújo Filho [Vinde]
Este opúsculo foi, se não o mais lido, certamente o mais importante dos numerosos livrinhos do pastor Caio Fábio, fenômeno de popularidade no Brasil nos anos 80 e 90, pastor midiático, influente, contundente, imitado, adorado e odiado. Caio nos ensinou a ver as coisas de outro jeito, e seu legado não vai desaparecer.
image24. “Vida Cristã Normal” (ou “Equilibrada”, na reedição) -- Watchman Nee [Editora dos Clássicos]
O controverso evangelista e autor chinês Nee teve muita influência nos anos 70 e 80, com sua visão mística do que significa ser um cristão evangélico conservador. Este livro foi seu maior sucesso, um comentário de Romanos, ainda que seu livro mais objetivo e claro seja “A Liberação do Espírito”.
image25. “É Proibido” -- Ricardo Gondim [Mundo Cristão]
Gondim é um dos melhores e mais polêmicos autores evangélicos contemporâneos. Seus livros, como Eu Creio, Mas Tenho Dúvidas, O que os Evangélicos (Não) Falam, Orgulho de Ser Evangélico, são sempre interessantes. Nenhum, porém, foi tão influente e marcante como “É Proibido”, um verdadeiro libelo anti-legalista.

26. “Conselheiro Capaz” -- Jay Adams [Fiel]
Adams era uma pessoa muito simpática. Sua escola de aconselhamento cristão é muito antipática. Diferentemente de Crabb, por exemplo, problemas emocionais têm origem fisiológica ou pecaminosa. Por isso, é preciso confrontar as pessoas e insistir na mudança do seu comportamento. Foi um sucesso nos anos 80. Haja behaviorismo!

27. “Quebrando Paradigmas” -- Ed René Kivitz [Abba Press]
Este livro foi decisivo para que os evangélicos brasileiros começassem a enxergar a outra margem do rio, a margem pós-evangélica do paradigma emergente. Kivitz é um autor surpreendente e notável, de mente dinâmica e arejada, que propõe importantes rupturas e renovações, como em seu outro livro “Outra Espiritualidade”.
image 28. “O Amor Tem Que Ser Firme” -- James Dobson [Mundo Cristão]
O conhecido “Dr. Dobson” é pensador e autor de grandes qualidades e grandes defeitos. Seus livros, como “Educando Crianças Geniosas”, ajudam famílias e promovem uma espécie de teologia aplicada que merece atenção. Há, porém, muito que não se deveria levar a sério, já que vai contra o que há de mais consagrado na psicologia moderna.
image 29. “Supercrentes” -- Paulo Romeiro [Mundo Cristão]
O autor de “A Crise Evangélica” tem talento e tem algo a dizer. Seus textos, especialmente o famosos “Supercrentes”, têm apontado para os exageros e enganos de muitas posturas comuns no meio evangélico contemporâneo.

30. “Cristianismo e Política” -- Robinson Cavalcanti [Ultimato]
Trata-se de um clássico. Este livro está nas origens de toda reflexão política evangélica. Robinson é importante por outras questões, como seus livros sobre sexualidade (“Uma Bênção Chamada Sexo”, “Sexualidade e Libertação”), mas sua contribuição permanente é o estímulo que deu à reflexão política evangélica.
image 31. “O Evangelho Maltrapilho” -- Brennan Manning [Mundo Cristão]
Não há outro autor mais importante no meio evangélico nos últimos dez anos do que Brennan Manning. Seus livros devocionais, como “O Impostor que Vive em Mim”, “A Assinatura de Jesus”, “O Obstinado Amor de Deus”, estão transformando radicalmente a maneira como os evangélicos entendem a vida cristã. Eu fico muito grato.
image 32. “O Pastor Desnecessário” -- Eugene Peterson [Mundo Cristão]
Peterson é muito estimado no meio evangélico brasileiro e um dos autores mais bem avaliados dos últimos tempos. Responsável por projetos como “The Message” (excelente paráfrase bíblica), tem nos galardoado com obras como “Corra com os Cavalos”, “A Oração que Deus Ouve”, “A Vocação Espiritual do Pastor”, “Transpondo Muralhas”, entre outros. Selecionei o que talvez seja o mais importante.
image 33. “Poder Através da Oração” -- E. M. Bounds [Batista Regular]
Nos anos 70, quando não havia ainda bons livros sobre oração, como o de Richard Foster ou o de Eugene Peterson, os livros de Bounds sobre oração circulavam de mão em mão, trazendo avivamento às igrejas. Hoje Bounds está quase esquecido. Quase.
image34. “Cristo é o Senhor” -- Dionísio Pape [ABU]
No fim dos anos 60 e começo dos anos 70, o nome de Pape se destacava pela espiritualidade, profundidade e sucesso ministerial. Seu opúsculo “Cristo é o Senhor” levou muitos à consagração e ao ministério.
image 35. “O Caminho do Coração” -- Ricardo Barbosa [Encontro]
Barbosa (junto com Osmar Ludovico, James Houston e outros) é responsável pelo retorno ao interesse pela mística cristã em nosso país. Seus livros nos ensinam uma outra atitude não somente em relação à vida, mas também em relação à teologia. Uma atitude contemplativa.
image 36. “O Novo Testamento Interpretado” -- R. N. Champlin [Hagnos]
Não privilegiei obras teológicas e comentários bíblicos nesta lista porque tais livros, em geral, não vendem bem e sua influência é pequena. Uma exceção precisava ser feita em relação ao favorito das bibliotecas. O empenho exaustivo de Champlin precisava ser lembrado, pois ainda vende bem e é o comentário primordial dos evangélicos.

37. “Icabode” -- Rubem Martins Amorese [Ultimato]
Este livro pode não ter sido tão lido quanto é citado, mas definiu um novo tipo de reflexão cristã no Brasil, que propõe diálogo com a cultura em outro nível que não o da evangelização, e sim o da discussão de valores e princípios que podem levar nossa sociedade para um patamar melhor ou pior. É uma boa influência.
image 38. “A Bíblia e o Futuro” -- Anthony Hoekema [Cultura Cristã]
Este estudo do Apocalipse cresceu em importância no Brasil em uma época em que quase não havia obra que fizesse uma defesa do amilenismo, apesar dos pouco conhecidos esforços de Harald Schally. O livro provocou conversões em massa a partir dos anos 80, e a escatologia nunca mais foi a mesma no Brasil.
image 39. “Cristianismo Puro e Simples” -- C. S. Lewis [Martins Fontes]
Também conhecido como “Mero Cristianismo”, a busca de Lewis pelo denominador comum da fé cristã impacta brasileiros desde os anos 70. Seleciono o livro simbolicamente, já que Lewis não poderia ficar de fora, seja por causa de “Os Quatro Amores”, “Milagres”, “Cartas do Inferno” ou “As Crônicas de Nárnia”.
image 40. “A Mensagem Secreta de Jesus” -- Brian D. McLaren [Thomas Nelson]
Em 2007 o leitor evangélico brasileiro foi surpreendido por este livro do mesmo autor de “Uma Ortodoxia Generosa”. Fiquei admirado ao ver como todos passaram a conhecer e a comentar a obra de McLaren, que representa melhor do que ninguém o paradigma teológico evangélico emergente. Não dá pra não ler.

Ricardo Quadros Gouvêa é ministro presbiteriano e professor de teologia e de filosofia.