segunda-feira, 20 de junho de 2011

A necessidade metafísica

Claro que para uma análise mais detalhada de um capítulo denso como esse que trata do problema da existência das coisas, precisaríamos de muito mais linhas.

Resumirei entretanto minha impressão:

Em primeiríssimo lugar, FS descarta a a-racionalidade1 da questão. E isso é um erro. Questões de fé são resolvidas no âmbito da fé. Ainda que se use a porta da razão para entrar ou sair delas, o nó só se desfará na sala da fé. Fé no sentido mais puro não implica em razão. Não, porque se falarmos de razão, então poderemos descartar o termo fé. A fé vem até mesmo suportar a razão, e é isso que FS faz. Baseado em sua fé ele apresentará as suas razões (que não podem ser tidas como universais).

Nosso mais corriqueiro erro está em achar que a razão sustenta a fé, enquanto que o contrário é que é verdadeiro.

Baseado na fé de um Deus triúno e pessoal Schaeffer irá apresentar suas razões, que são desdobramentos dessa fé – o caminho inverso sempre será traiçoeiro. Eis o problema da apologética: pretende-se baseado na razão chegar a postulados de fé. O resultado sempre é hilariante senão trágico.

Só posso, na verdade afirmar, que existem coisas que não se enquadram no âmbito racional, pois essa é minha fé. Acho que foi Kant quem deu a última cartada nas pretensões racionalistas.

O segundo ponto irá evidentemente perder força se descarto uma urgência racional. Quando FS afirma que existem três respostas possíveis para a existência das coisas, surgiram do nada, de algo impessoal ou de alguém. A força do argumento vai embora quando pensamos que essa existência das coisas está no campo da fé e não da razão, e não adianta o quanto nossa razão se esperneie, sempre poderá haver um contra argumento baseado naquilo que se crê.

Assim para mim o nada pode muito bem representar o Deus infinito, que não se compara a nada do que foi criado. O espírito se assemelha muito mais ao ar, ao vento, do que a uma pedra. A algo invisível, do que a algo concreto.

O problema persiste se digo que o universo surgiu de algo ou alguém. Pois paira a pergunta tão comum às crianças: Mas quem então criou esse algo ou alguém? De que Deus é feito?

Para nós que cremos (e isso é uma questão de fé) está claro que as coisas, o mundo foi criado. O Criador não foi criado. Mas para um incrédulo, até não aceitar esse postulado, e isso se dá via fé – ficará uma questão ou outra. Mas de onde surgiu esse seu Deus: do nada, de algo ou de alguém?

A outra questão que pode ficar (e FS nem sequer aborda isso) é que tudo tenha sempre existido. Não houve um começo. Não existe uma origem. Tanto o pessoal como o impessoal e o movimento se dá em um ciclo eterno.

Os argumentos de Schaeffer se dão baseados nisso e isso não é dito de forma aberta: houve um começo. E logicamente se partirmos da hipótese que houve um começo a pergunta que fica é o que houve antes desse começo. E a resposta lógica acaba sendo Deus, seja lá o que se entenda por Deus.

O outro passo argumentativo de FS está em afirmar então que esse Deus só poderia, logicamente, ser triúno e pessoal. Porque a pessoalidade só poderia se originar de uma suposta pessoalidade divina e a diversidade só poderia vir de uma suposta diversidade divina (que porém una).

Como partilho da mesma fé de FS devo dizer que seus argumentos são fortes. Não posso porém deixar de dizer que me parecem tendenciosos. Pois as perguntas pairariam no patamar da divindade, como então explicar a origem da pessoalidade divina e da diversidade divina.

Transferimos nossas dúvidas para um nível mais resumido, da divindade, do sagrado, e as convertemos em dogmas. Mas não podemos com isso achar que todos os problemas lógicos se resolveram.

1Em contraste ao racional ou irracional.